Acido Bempedóico para Dislipidemia
Um dos trabalhos que chamou a atenção no congresso do American College of Cardiology (ACC) de 2023 foi o CLEAR OUTCOMES que avaliou o uso do ácico bempedoico em pacientes que não toleram estatina. Este tópico revisa o que fazer nessa situação e traz o que o artigo agrega [1].
Intolerância à estatina
As estatinas são parte fundamental do tratamento e profilaxia das complicações da aterosclerose. A impossibilidade de utilizar essas drogas pode piorar os desfechos cardiovasculares [2].
O principal evento adverso que leva à suspensão das estatinas é a miopatia. Existem três alternativas para evitar a suspensão desse medicamento uma vez que ocorram efeitos adversos [3]:
- Troca por um outro tipo de estatina
- Redução da dose
- Utilizar em dias alternados
O paciente é considerado intolerante à estatina apenas quando não consegue utilizar o medicamento mesmo utilizando essas estratégias. A dificuldade de utilização pode ser tanto por evento adverso grave, como rabdomiólise, ou por incapacidade de garantir adesão devido a sintomas adversos.
Mesmo com as medidas para evitar a suspensão, é possível que ocorra intolerância em alguns pacientes pelo efeito nocebo. Efeito nocebo é um fenômeno psicológico em que uma expectativa negativa em relação a um tratamento leva o paciente a apresentar sintomas adversos, mesmo que o tratamento em si não seja a causa direta desses sintomas.
Falamos mais sobre esse tema no Episódio 177: Mialgia por estatina.
Sobre o ácido bempedoico
O ácido bempedoico é um medicamento que inibe a ação da enzima ATP-citrato liase, que está envolvida na síntese do colesterol. Sua ação é semelhante à das estatinas, mas o ácido bempedoico é metabolizado apenas no fígado , e não nos músculos, o que pode resultar em uma taxa menor de miopatia.
Em 2019, o NEJM publicou um trabalho de segurança e eficácia dessa droga, chamado CLEAR harmony [4]. Neste trabalho, o ácido bempedóico reduziu o LDL em 18% na semana 12. Em relação a segurança, a taxa de miopatia foi similar ao placebo, porém o grupo que fez uso do ácido bempedóico teve maior incidência de gota e de elevação do ácido úrico.
Mesmo com trabalhos mostrando redução do LDL e com aprovação do Food and Drug Administration (FDA) para este fim, faltavam estudos que comprovassem a capacidade do ácido bempedóico de reduzir eventos cardiovasculares.
O que o estudo acrescenta?
O estudo CLEAR OUTCOMES foi feito para avaliar se o ácido bempedóico conseguiria reduzir eventos cardiovasculares. Os pesquisadores randomizaram 13.970 pacientes que tinham recomendação de profilaxia primária ou secundária de eventos cardiovasculares e que eram intolerantes à estatina.
Os pacientes primeiro recebiam placebo por 4 semanas. Caso não apresentassem sintomas adversos nesse período, eram randomizados para receber ácido bempedoico 180 mg ou placebo. O desfecho primário foi uma composição de morte por causas cardiovasculares, infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral e revascularização coronariana.
Com um seguimento médio de 40 meses, o trabalhou encontrou uma menor taxa de eventos cardiovasculares no grupo intervenção (um risco 13% menor do que o placebo). Também ocorreu uma redução de LDL de mais de 20% no grupo intervenção e de proteína C reativa ultrassensível, ambos com diferença significativa em relação ao placebo.
O grupo intervenção teve maiores taxas de elevação de enzimas hepáticas, creatinina e ácido úrico. Esse grupo também teve mais eventos de gota e colelitíase.
O estudo é animador, porém o alto custo do ácido bempedóico é um limitante. Além disso, o perfil de eventos adversos precisa ser mais explorado em estudos futuros. É necessário sempre insistir com as estatinas antes de considerar trocar de classe.
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