Amnésia Global Transitória
A Amnésia global transitória (AGT) é uma síndrome caracterizada pelo comprometimento agudo e passageiro da memória. Geralmente é vista na emergência e tem como diagnóstico diferencial doenças graves como AVC. Este tópico revisa a definição, fatores de risco, abordagem no pronto-socorro e seguimento após o evento.
Definição e fatores de risco de amnésia global transitória
Amnésia anterógrada é a incapacidade súbita de reter novas informações após o evento, enquanto a amnésia retrógrada é a incapacidade de recordar informações gerais prévias.
A amnésia global transitória (AGT) é caracterizada por amnésia anterógrada, sem comprometimento da atenção e demais funções cognitivas, por vezes acompanhada de amnésia retrógrada.
A orientação autopsíquica está preservada na AGT, mesmo na presença da amnésia retrógrada. Orientação autopsíquica é a orientação do indivíduo em relação a si mesmo, ou seja, o fato de recordar o próprio nome, idade, data de nascimento e demais informações pessoais.
A AGT classicamente ocorre em pessoas com mais de 50 anos. Os episódios são autolimitados, com resolução da amnésia anterógrada em 24 horas. Contudo, é comum pacientes apresentarem uma lacuna de memória do período da AGT.
A amnésia retrógrada pode permanecer por período de muitas horas ou dias e, raramente, anos. Um estudo retrospectivo com 277 casos relatou que os episódios tiveram uma duração média de 6 horas, sendo a maioria com duração de 2 a 12 horas [1].
A fisiopatologia ainda não foi determinada. Comprometimento vascular, enxaqueca, epilepsia e causas psicogênicas são algumas das hipóteses [2, 3]. Alguns estudos encontraram associação com enxaqueca e há evidências conflitantes sobre a relação com fatores de risco cardiovasculares (HAS, DM e dislipidemia) [4-7].
Em um relato brasileiro de 1985 com 26 casos, a média de idade foi de 65 anos e 88,5% dos casos apresentaram um único episódio em 84 meses de seguimento [8].
Abordagem inicial à amnésia global transitória no pronto-socorro
O diagnóstico da AGT é clínico (ver tabela 1). O paciente deve permanecer em observação até que a amnésia desapareça.
A amnésia anterógrada é o sintoma principal que se manifesta por um questionamento repetitivo, geralmente sobre a data e o local (por exemplo, “onde estou?” ou “o que aconteceu?”). Esse achado é sensível, mas não é específico para o diagnóstico de AGT [2].
Há relatos de cefaleia leve, náuseas e, menos frequentemente, tontura após o evento [2, 5, 9]. A presença de alteração do nível de consciência e desorientação autopsíquica excluem o diagnóstico de AGT [2].
O exame neurológico está normal durante e após o episódio. A presença de febre, alterações neurológicas focais e déficits cognitivos tornam o diagnóstico improvável [10].
A neuroimagem é indicada em todos os pacientes para excluir outros diagnósticos. A tomografia de crânio é mais disponível e o exame é normal ou mostra achados não relacionados. A ressonância magnética de crânio (RM) é preferível para excluir isquemia e outras condições. A RM pode estar normal ou mostrar uma ou mais lesões puntiformes no hipocampo com restrição à difusão. Essas lesões diferem de lesões isquêmicas já que tendem a ser menores, ocorrem mais tardiamente e se resolvem com o tempo.
Essas lesões puntiformes hipocampais são mais prevalentes após 12 horas do início do evento e persistem frequentemente durante 7 a 10 dias. Ao realizar acompanhamento com imagem, tendem a se resolver [11].
Exames laboratoriais como eletrólitos, glicose e exame toxicológico também auxiliam na exclusão de encefalopatias tóxico-metabólicas.
Não há tratamento específico para AGT. O UpToDate sugere o uso de 500 mg de tiamina por via endovenosa, ponderando a possibilidade de que uma encefalopatia de Wernicke (EW) leve seja confundida com AGT e que nenhum teste permite confirmar ou excluir imediatamente a EW.
Em casos em que a AGT não é presenciada, o diagnóstico é clínico, baseado na história e sintomas do paciente.
Seguimento clínico da amnésia global transitória
Deve-se tranquilizar o paciente e a família quanto a benignidade do quadro e a baixa probabilidade de recorrência. Em uma revisão com 213 pacientes, aproximadamente 15% dos pacientes tiveram mais do que um episódio com um intervalo médio entre episódios de cerca de 2 anos e quase dois terços tiveram três ou mais episódios definitivos ou prováveis [12].
Questiona-se a associação de AGT com comprometimento cognitivo leve e afasia progressiva primária [13, 14].
Não há indicação de terapia antitrombótica na ausência de isquemia documentada e não há aumento do risco de mortalidade, epilepsia, AVC ou síndrome demencial após a AGT [3, 15-18]. No entanto, uma análise de propensão de dados de mais de 14.000 pacientes coreanos sugeriu que pode haver um risco minimamente mais elevado de um AVC futuro [19].
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