Tratamento de COVID-19 Ambulatorial
A COVID-19 ainda é a maior causa de síndrome respiratória aguda grave no Brasil em 2024 [1], ressaltando a importância da busca por um tratamento eficaz. O nirmatrelvir/ritonavir (paxlovid®) diminui o risco de hospitalização em pacientes não vacinados, mas o benefício em pacientes vacinados ainda é incerto. Em abril de 2024 foi publicado no New England Journal of Medicine (NEJM) um estudo que avalia a medicação em pacientes vacinados [2]. Esse tópico revisa o tratamento ambulatorial de COVID-19, assim como o isolamento domiciliar e as recomendações sobre vacinação.
Tratamentos para COVID-19
Os tratamentos para COVID-19 podem ser divididos em dois grupos: antivirais e imunomoduladores. O tratamento de COVID-19 em pacientes sem necessidade de hospitalização está descrito na tabela 1.
- Antivirais: nirmatrelvir/ritonavir e molnupiravir são recomendados para pacientes ambulatoriais com fatores de risco para hospitalização. Já o remdesivir é recomendado tanto para pacientes ambulatoriais quanto internados. Simnotrelvir e o ensitrelvir estão em estudo, mas ainda não há recomendação de uso.
- Imunomoduladores: são recomendados exclusivamente para pacientes internados. Corticoides são a droga de escolha, sendo a dexametasona o mais estudado. Em pacientes selecionados, os inibidores de interleucina 6 (tocilizumabe e sarilumabe) e os inibidores de JAK (baracitinibe) são recomendados como segundo imunomodulador. Infliximabe e abatacept são alternativas com menos estudos.
A anticoagulação plena na COVID-19 ainda é discutida para pacientes internados. Em pacientes ambulatoriais, não é recomendada.
O nirmatrelvir/ritonavir está disponível no SUS. Em março de 2024 o Ministério da Saúde facilitou a prescrição da medicação, sendo necessária apenas receita comum em duas vias [3]. Mais detalhes sobre nirmatrelvir/ritonavir estão no tópico sobre Nirmatrelvir/Ritonavir para Tratamento de COVID-19.
Benefício de antivirais em pacientes vacinados
A evidência para o uso de antivirais vem de estudos em pacientes não vacinados [4, 5, 6]. Há dúvida sobre o benefício em vacinados.
Em abril de 2024 foi publicado no New England Journal of Medicine um estudo com nirmatrelvir/ritonavir em pacientes vacinados [2]. Foram 1288 pacientes ambulatoriais com COVID-19 randomizados para receber nirmatrelvir/ritonavir ou placebo. Foram selecionados pacientes com fatores de risco e vacinados, pacientes sem fatores de risco não vacinados e pacientes vacinados que não receberam vacina no último ano. Os fatores de riscos mais comuns foram obesidade (18%), tabagismo (13%) e hipertensão (12%). Apenas 5% dos pacientes tinham 65 anos ou mais. O desfecho primário foi tempo para alívio de sintomas. Hospitalização foi avaliada como desfecho secundário.
Não houve diferença no desfecho primário entre os dois grupos. No grupo com fatores de risco, hospitalização ou morte ocorreram em três pacientes do grupo tratamento (0,9%) e em sete pacientes no grupo placebo (2,2%), mas a diferença não atingiu significância estatística. O número de eventos adversos foi similar nos dois grupos, com destaque para disgeusia que ocorreu em 6,7% dos pacientes em uso de nirmatrelvir/ritonavir.
Apesar do desfecho negativo, houve pouca representatividade de pacientes idosos ou com comorbidades graves, populações com maior potencial de benefício. O baixo número de eventos como hospitalização pode dificultar encontrar diferença estatística. Apesar do estudo sugerir que não há benefício em pacientes de alto risco vacinados, estudos com maior número de eventos e com pacientes de mais alto risco são necessários para confirmar essa hipótese.
Isolamento domiciliar
O tempo de isolamento domiciliar para pacientes com COVID-19 recomendado pelo Ministério da Saúde é atualmente de sete dias a contar do início dos sintomas se o paciente estiver afebril há pelo menos 24 horas e em melhora dos sintomas respiratórios [3]. As medidas de controle como uso de máscara devem ser mantidas até o 10º dia de sintomas, pois ainda há risco de transmissão. As recomendações de isolamento do Ministério da Saúde, incluindo outros grupos e uso de exames estão reunidos na tabela 2.
A duração do isolamento se baseia em estudos que utilizaram cultura viral como marcador de infectividade. Foi observado de forma consistente entre os estudos que após esse período a maioria dos pacientes não transmitia a doença [7-10]. O período de transmissão parece ser maior em pacientes com quadros graves ou com comorbidades. Por isso a diferença de recomendação nesses grupos.
Em março de 2024, o Center for Disease Control publicou uma mudança nas recomendações de isolamento de COVID-19. A recomendação atual é de retornar às atividades caso esteja há 24 horas sem febre e em melhora dos sintomas. Nos cinco dias subsequentes devem ser mantidos cuidados para evitar transmissão, como uso de máscaras e distanciamento. A recomendação se assemelha às de infecção pelo vírus da influenza e o vírus sincicial respiratório. O Ministério da Saúde até o momento não atualizou suas recomendações.
Múltiplas doses de vacina contra COVID-19
Em maio de 2024 foi incorporada ao SUS a vacina monovalente contra a variante Ômicron, subvariante XBB 1,5, chamada de Spikevax. A incorporação se baseia no aumento do número de casos da variante no Brasil e na menor imunogenicidade das vacinas criadas com o vírus inicial. A recomendação do Ministério da Saúde para vacinação contra COVID-19 é:
- Crianças de 6 meses a 4 anos, 11 meses e 29 dias: 2 doses de vacina com intervalo de 4 semanas entre elas
- Pessoas com mais de 5 anos: 1 dose de vacina.
- Pessoas com mais de 5 anos de grupos prioritários: 3 doses de vacina e reforço anual ou semestral conforme o risco (tabela 3)
O uso de doses de reforço é baseado em estudos que demonstraram diminuição de imunidade humoral e celular (medida laboratorialmente), proteção contra doença sintomática e hospitalização conforme o tempo após vacinação [11-14]. Esse efeito parece ser maior em populações mais suscetíveis como imunossuprimidos e idosos [15]. Alguns estudos sugerem que a aplicação de doses de reforço restaura eficácia vacinal e aumentam a imunidade humoral e celular contra a COVID-19 [13, 16, 17]. O intervalo das doses de reforço ainda é incerto [18].
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