Em Tempo

Atualização sobre Antibiótico em Infusão Estendida: Estudo BLING III

Criado em: 22 de Julho de 2024 Autor: Frederico Amorim Marcelino

A infusão estendida ou contínua de antibióticos foi abordada no tópico Antibióticos em Infusão Estendida versus Intermitente. Este tópico de atualização traz um resumo do estudo BLING III, publicado em junho de 2024 no Journal of the American Medical Association (JAMA) com novidades sobre o tema [1].

A recomendação da Surviving Sepsis Campaign

As diretrizes de sepse da Surviving Sepsis Campaign de 2021 recomendam o uso de antibióticos em infusão estendida ou contínua para o tratamento de pacientes com sepse [2].

A recomendação é baseada em uma meta-análise e revisão sistemática de 2018 que encontrou diminuição de mortalidade com o uso dessa estratégia [3]. Contudo, estudos randomizados não encontraram essa diferença. Diante da evidência inconclusiva, o estudo BLING III foi idealizado.

O estudo BLING III

O BLING III foi um ensaio clínico randomizado que selecionou 7202 pacientes internados em UTI com diagnóstico sugestivo de sepse nas últimas 24 horas e que iniciaram tratamento com meropenem ou piperacilina com tazobactam. Foram incluídas 104 UTIs de sete países diferentes, sem cegamento. O grupo intervenção recebeu antibioticoterapia em infusão contínua, enquanto o grupo controle em infusão intermitente.

O desfecho primário avaliado foi mortalidade em 90 dias. Os desfechos secundários foram mortalidade em UTI ou durante internação hospitalar, aquisição de bactérias multi-resistentes ou infecção por Clostridioides difficile. Também foi avaliada a cura clínica, considerada como término do tratamento antimicrobiano em 14 dias sem necessidade de iniciar novo curso de antibioticoterapia após 48 horas.

Os principais sítios de infecções foram pulmonares (59,5%), intra-abdominal(13%) e corrente sanguínea (8%). A origem da admissão em UTI incluiu sala de emergência (34%), enfermaria (29%), centro cirúrgico após cirurgia de emergência (20,5%) e após cirurgia eletiva (7,5%). A mediana do tempo de internação até começar a randomização foi de 25 horas.

Considerando o desfecho primário, a mortalidade no grupo infusão contínua foi de 24,9% e no grupo intermitente de 26,9%. Essa diferença não teve significância estatística (diferença de -1,9%, IC 95% de -4,9% - 11%, p = 0,08). Já a cura clínica demonstrou significância estatística, sendo maior no grupo infusão contínua (55,7% versus 50%, diferença de 5,7%, IC 95% de 2,4 a 9,1%, p < 0,001). Os outros desfechos secundários foram similares nos dois grupos. Um paciente do grupo infusão contínua apresentou encefalopatia, que foi associada ao meropenem.

Meta-análise e revisão sistemática

Em conjunto com o BLING III, o JAMA também publicou uma nova revisão sistemática e meta-análise comparando infusão estendida/contínua com infusão intermitente para o manejo de pacientes com sepse [4]. Foram 17 estudos randomizados avaliados, incluindo o BLING III. A maioria dos estudos comparou apenas a infusão contínua com a estratégia de doses intermitentes. Meropenem e piperacilina com tazobactam foram os antibióticos mais estudados.

Na avaliação, o uso de antibióticos em infusão contínua foi associado à diminuição de mortalidade em 90 dias. O NNT estimado é de 26. A estratégia também foi associada a maior probabilidade de cura clínica.

Assim como as evidências anteriores, a meta-análise encontrou um efeito não demonstrado nos ensaios clínicos randomizados. Essa diferença pode ocorrer pelo tamanho do estudo, ou seja, se mais pacientes fossem incluídos nos ensaios clínicos, o efeito poderia ser encontrado. Pelo mesmo motivo, o tamanho do efeito deve ser pequeno, já que tantos pacientes são necessários para torná-lo evidente.

O custo de implantar infusão contínua nos hospitais, além do aumento de trabalho de equipes como enfermagem e farmácia, não foram avaliados nos estudos. Essas são considerações importantes ao avaliar a inclusão dessa medida em protocolos institucionais.

Aproveite e leia:

11 de Setembro de 2023

Antibiótico em Infusão Estendida versus Intermitente

Infusão estendida e contínua são estratégias para potencializar o efeito dos antibióticos beta-lactâmicos. Em junho de 2023 no Journal of the American Medical Association (JAMA) foi publicado um estudo que compara o uso contínuo de meropenem com uso intermitente em pacientes com sepse. Esse tópico revisa o tema.

18 de Novembro de 2024

Crise Álgica na Anemia Falciforme

A crise álgica é a principal causa de hospitalização em pacientes com anemia falciforme. A hidratação é um componente do tratamento e um estudo publicado no Journal of American Medical Association em setembro de 2024 avaliou o melhor fluido nesse contexto. Esse tópico aborda o manejo da crise álgica e as implicações deste novo estudo.

3 de Abril de 2023

Lesão Renal Aguda no Paciente com Cirrose

Cirrose é uma condição grave e com muitas complicações próprias do quadro. A ocorrência de lesão renal aguda (LRA) nesses pacientes tem particularidades que tornam o manejo minucioso. O New England Journal of Medicine (NEJM) trouxe uma revisão sobre o tema em 2023 e aproveitamos para revisar também aqui neste tópico.

10 de Outubro de 2022

Fluidos na Pancreatite Aguda

Recentemente o New England Journal of Medicine publicou o Waterfall, um estudo sobre ressuscitação volêmica na pancreatite aguda. Um tema muito discutido e com poucas evidências. Vamos ver o que essa nova evidência acrescentou e revisar o tópico.

9 de Janeiro de 2023

Vasopressores e Corticoide no Choque Séptico

Choque séptico é a principal causa de morte nas UTIs do Brasil. Apesar da crescente conscientização e de diretrizes recentes como a do Surviving Sepsis Campaign (SSC) de 2021, há incerteza na literatura sobre quando iniciar vasopressores e corticoides. Em maio de 2022, foi publicada uma revisão sobre este assunto no Annals of Critical Care e aproveitamos para trazer os principais pontos.