Manejo de Agitação Psicomotora
Avaliação Inicial
Agitação psicomotora pode ser definida como um estado de hiperatividade motora ou cognitiva com acentuada excitação emocional [3]. Isso pode estar atrelado a atitudes violentas (atos com objetivo de provocar danos). A agitação psicomotora é uma manifestação associada a condições clínicas e psiquiátricas.
A anamnese pode identificar a causa da agitação, porém costuma estar prejudicada pelo próprio quadro comportamental. Ausência de acompanhantes para fornecer dados da história é um complicador. Pode ser necessário primeiro acalmar ou conter o paciente devido ao risco de violência [4].
Frente a um primeiro episódio de agitação, deve-se assumir que esta é uma consequência de uma doença clínica subjacente até se provar ao contrário. Uma forma de agrupar as etiologias é através do mnemônico FIND-ME (“encontre-me”, em inglês), detalhado na tabela 1.
Alguns achados favorecem a presença de uma causa não-psiquiátrica responsável pela agitação [5, 6]:
- Início súbito do quadro
- Idade superior a 45 anos
- Ausência de passado psiquiátrico
- Alterações nos sinais vitais, como febre e hipoxemia
- Rebaixamento do nível de consciência
- Distúrbios da atenção
- Exame neurológico anormal
- Flutuação dos sintomas psiquiátricos
Veja mais em "Investigação de Primeiro Episódio Psicótico" e "Tomografia de Crânio no Delirium".
Os exames complementares devem ser direcionados pela suspeita clínica e estão detalhados na tabela 2.
Graduação de agitação e preparação para o atendimento
A agitação pode ser graduada conforme a intensidade, determinando o ambiente de atendimento e as condutas seguintes [7]:
- Leve: inquieto, mas consegue conversar, está colaborativo e não violento.
- Moderada: agitação mais importante, com difícil diálogo e não cooperação. Podem apresentar discurso agressivo, mas sem auto ou heteroagressividade.
- Grave: extremamente combativo, com violência manifesta.
A agitação grave frequentemente necessita de manejo em sala de emergência. Os dois primeiros níveis de agitação podem ser atendidos em consultório. O atendimento deve ser priorizado para evitar o escalonamento do comportamento e a equipe deve ser avisada e preparar um plano de ação caso haja agitação grave.
A sala em que será realizada a consulta deve ter características específicas que assegurem a segurança da equipe e do paciente, além de não contribuir para a agitação. Um exemplo de ambiente adequado está na figura 1 [2].
Medidas não farmacológicas
Existem três estratégias principais para o controle de agitação: descalonamento verbal, contenção química e contenção mecânica. Essas medidas devem ser empregadas em paralelo com a identificação da causa.
A primeira estratégia a se utilizar é o descalonamento verbal, uma técnica de comunicação capaz de resolver parte das agitações. O descalonamento verbal utiliza elementos de comunicação desenvolvidos e validados para este cenário. Esses elementos estão listados na tabela 3 e exemplificados neste vídeo da University of Colorado School of Medicine. Quando a comunicação verbal é insuficiente, a necessidade de tratamento medicamentoso está mais respaldada.
A contenção mecânica temporária pode ser necessária caso o paciente coloque em risco sua vida, a integridade da equipe ou dos outros pacientes. A medida também pode ser indicada se o quadro piorar apesar da abordagem verbal e farmacológica. Essa intervenção deve ser postergada ao máximo e utilizada pelo menor tempo possível, já que tem risco de eventos adversos físicos e psicológicos, questionamentos éticos, impacto na relação médico-paciente e não aborda a causa da agitação. A contenção química deve ser usada em conjunto para encurtar o tempo de contenção química [8, 9].
Preferencialmente, o médico responsável pelo atendimento não deve participar da manobra para evitar a quebra do vínculo. Durante todo o procedimento, cada etapa deve ser comunicada ao paciente e seus familiares, bem como registrada em prontuário [2]. A figura 2 detalha o procedimento de contenção mecânica.
Durante o período de imobilização, o paciente deve ser avaliado com frequência e suas necessidades básicas devem ser respeitadas. Outros cuidados incluem o reposicionamento e vigilância quanto a perfusão dos membros [4].
As medidas farmacológicas devem ser intensificadas para abreviar o período de restrição, minimizando o risco de complicações. As complicações mais graves associadas a contenção mecânica são [10]:
- Rabdomiólise
- Lesões ortopédicas
- Trombose venosa profunda
- Desidratação
- Asfixia
- Sofrimento psíquico
- Morte súbita
Conduta farmacológica
O paciente agitado pode necessitar de auxílio farmacológico para possibilitar o cuidado, especialmente na falha do descalonamento verbal ou na agitação grave.
O objetivo é controlar a agitação através do menor tempo e grau de sedação possível. O paciente deve estar desperto para avaliação clínica e psiquiátrica. A sedação excessiva prolonga a estadia no ambiente hospitalar [11, 12].
Em agitações leves a moderadas, a via oral deve ser inicialmente utilizada. Essa via possui maior tempo de latência para o efeito da medicação.
Caso agitação grave ou falha no controle dos sintomas com as medicações orais, a via parenteral deve ser utilizada, sendo a intramuscular a mais recomendada. A via intravenosa, apesar de eficaz, está associada a mais efeitos adversos cardíacos e respiratórios, além de necessitar de acesso intravenoso, um procedimento dificultado pela agitação [13].
Existem três classes principais de fármacos que podem ser utilizadas isoladamente ou em combinação:
- Antipsicóticos típicos e atípicos
- Benzodiazepínicos
- Anestésicos dissociativos
A escolha da medicação depende da etiologia da agitação, comorbidades, potencial sedativo e efeitos colaterais associados. As drogas mais utilizadas, doses e peculiaridades se encontram na tabela 4.
Os antipsicóticos são os fármacos de escolha para delirium ou psicoses primárias. Os benzodiazepínicos são preferidos em abstinência relacionada a fármacos depressores como o álcool, transtorno de ansiedade generalizada ou intoxicações por estimulantes. Na agitação sem etiologia clara, ambas as classes podem ser utilizadas, com a literatura favorecendo os benzodiazepínicos [14].
A terapia combinada de antipsicóticos e benzodiazepínicos potencializa o efeito de ambas as medicações, útil para um rápido controle da agitação grave, e reduz eventos adversos de uma única droga em dose alta [15-17]. Para agitação grave, essa combinação é uma opção pelas diretrizes [18-20].
Antipsicóticos associados a anti-histamínicos também podem ser utilizados. Alguns estudos encontraram redução de eventos adversos extrapiramidais dos antipsicóticos quando administrados em conjunto com anti-histamínicos, um possível efeito da ação anticolinérgicas destas medicações [21, 22]. Esse achado não foi encontrado em todos os trabalhos e pode existir risco aumentado de outros eventos adversos [23, 24]. Por existirem alternativas com evidências mais consistentes, como antipsicóticos e benzodiazepínicos, os anti-histamínicos não são opções de primeira linha pelas diretrizes [25].
Em situações extremas, a quetamina intramuscular pode ser utilizada pelo seu rápido início de ação e eficácia, com ciência de seus efeitos adversos potencialmente graves e necessidade de monitorização contínua [26].
O atendimento do paciente em agitação psicomotora pode ser sistematizado conforme o fluxograma 1.
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