Tratamento de Hipercalemia e o Ciclosilicato de Zircônio (Lokelma®)

Criado em: 03 de Novembro de 2025 Autor: Jonatas Lourival Zanoveli Cunha Revisor: Frederico Amorim Marcelino

A hipercalemia é um distúrbio frequente e está associada a arritmias graves e parada cardiorrespiratória. Este tópico revisa o tratamento de hipercalemia aguda com destaque para o uso do ciclossilicato de zircônio sódico (Lokelma®), medicamento aprovado para uso no Brasil. 

O Guia TdC já abordou hipercalemia na revisão de "Urgências Dialíticas" e "Eletrocardiograma nos Distúrbios Eletrolíticos".

Definição e abordagem

Definição e manifestações

Hipercalemia é definida como a presença de valores de potássio acima do limite superior de normalidade. Alguns autores utilizam como referência concentrações ≥ 5,5 mEq/L, mas esse ponto de corte pode variar entre laboratórios [1,2]. 

As principais manifestações de hipercalemia são fraqueza muscular, arritmias e parada cardiorrespiratória, geralmente associada à assistolia ou fibrilação ventricular. [3]. A tabela 1 reúne os principais fatores precipitantes de hipercalemia.

Tabela 1
Fatores de risco para hipercalemia.
Fatores de risco para hipercalemia.

Distúrbios do potássio podem alterar o eletrocardiograma (figura 1). A probabilidade de alterações no eletrocardiograma (ECG) aumenta conforme aumenta o nível de potássio [4,5]. Veja mais em "Eletrocardiograma nos Distúrbios Eletrolíticos". 

Figura 1
Alterações eletrocardiográficas na hipercalemia.
Alterações eletrocardiográficas na hipercalemia.

A gravidade da hipercalemia pode ser classificada conforme os valores séricos de potássio e a presença de alterações eletrocardiográficas [2,6]:

  • Leve: 5,0–5,9 mEq/L sem alterações no ECG. 
  • Moderada: 6,0–6,4 mEq/L ou na presença de alterações no ECG com potássio entre 5 - 5,9 mEq/L.
  • Grave: ≥ 6,5 mEq/L ou ≥ 6 mEq/L com alteração no ECG. 

Abordagem

O tratamento da hipercalemia deve ser imediato nos seguintes casos [7,8]:

  • Presença de manifestações clínicas. 
  • Potássio sérico > 6,0 mEq/L.
  • Risco de elevação rápida devido à lesão tecidual importante (como rabdomiólise, síndrome de lise tumoral e trauma com esmagamento) ou absorção contínua de potássio (sangramento gastrointestinal significativo). 
  • Presença de oligúria ou doença renal crônica estágio V.

Pacientes com potássio entre 5,5 e 5,9 mEq/L que não apresentam os critérios acima podem ter o potássio reduzido lentamente. As intervenções incluem ajustes dietéticos, retirada de fatores precipitantes (como anti-inflamatórios), uso de diuréticos, correção da acidose metabólica ou emprego de resinas de troca de forma contínua.

O manejo da hipercalemia aguda pode ser estruturado em quatro passos [2]: 

  • Realização de ECG e estabilização da membrana cardíaca, se necessário.
  • Medidas que promovem o deslocamento do potássio para o meio intracelular.
  • Medidas de remoção de potássio.
  • Reavaliação e prevenção de recorrência.

As principais terapias utilizadas no tratamento da hipercalemia aguda estão na tabela 2.

Tabela 2
Medicamentos utilizados na hipercalemia aguda.
Medicamentos utilizados na hipercalemia aguda.

Eletrocardiograma e estabilização de membrana

Nos pacientes com potássio ≥ 6,0 mEq/L, recomenda-se realizar ECG de 12 derivações (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35658162/, https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). A monitorização cardíaca contínua é recomendada nos casos em que o potássio seja ≥ 6,5 mEq/L ou na presença de alterações eletrocardiográficas sugestivas de hipercalemia (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). O ECG pode estar normal diante de uma hipercalemia grave ou pode mimetizar outras condições, como o infarto agudo do miocárdio (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/12468487/, https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/3717152/). 
 
Em pacientes com alterações eletrocardiográficas sugestivas de hipercalemia e/ou potássio sérico ≥ 6,5 mEq/L, é recomendada a infusão de cálcio intravenoso (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35658162/). A administração do cálcio não reduz os níveis séricos de potássio. A justificativa teórica é que a elevação do cálcio diminui o efeito do excesso de potássio na membrana cardíaca, protegendo o coração contra arritmias. Apesar de recomendado em revisões e diretrizes, a evidência de benefício clínico é incerta pela falta de ensaios clínicos randomizados (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/39761907/, https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35658162/).

Cálcio intravenoso

As duas formulações intravenosas de cálcio disponíveis são o gluconato de cálcio e o cloreto de cálcio. Ambos estão disponíveis em ampolas de 10 mL a 10%, mas diferem em concentração de cálcio elementar: o gluconato contém cerca de 2,3 mmol de cálcio por ampola (90 mg de cálcio elementar), enquanto o cloreto fornece cerca de 6,8 mmol de cálcio por ampola (270 mg de cálcio elementar), ou seja, o triplo do cálcio (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35658162/,https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29731287/,https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). O gluconato de cálcio pode ser administrado em veia periférica devido ao menor risco de necrose tecidual em caso de extravasamento, enquanto o cloreto de cálcio, por seu potencial de lesão local, deve ser administrado preferencialmente por acesso venoso central (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29731287/,https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf).

As doses sugeridas são de 10 a 30 mL de gluconato de cálcio 10% ou 10 mL de cloreto de cálcio 10%, infundidos entre 2 a 10 minutos (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35658162/,https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). As soluções de cálcio não devem ser administradas em conjunto com bicarbonato de sódio na mesma via ou seringa, devido ao risco de precipitação de carbonato de cálcio. 

A ação do cálcio na membrana cardíaca ocorre em cerca de 1 a 3 minutos após sua infusão. O ECG de controle após administração deve ser repetido em cerca de 5 a 10 minutos, e, na ausência de mudança eletrocardiográfica, nova dose pode ser administrada (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35658162/,https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). A duração do efeito do gluconato e cloreto de cálcio é de cerca de 30 a 60 minutos, motivo pelo qual a monitorização contínua, tratamento da causa de base e terapias de controle da hipercalemia devem ser realizadas em paralelo (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35658162/,https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29731287/,https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). 

Medidas que promovem o deslocamento intracelular (shift) de potássio

As medidas de shift promovem a entrada do potássio para o meio intracelular, reduzindo temporariamente sua concentração sérica, sem o remover do organismo. As duas medidas de shift são: administração intravenosa de insulina com glicose e inalação com β2-agonista.

Insulina e glicose

A insulina atua no músculo esquelético ativando a bomba Na⁺-K⁺ ATPase. Isso promove o transporte de K⁺ para o interior da célula, reduzindo os níveis séricos de potássio. O uso é geralmente associado à administração de glicose, para prevenir hipoglicemia. 

A solução de insulina com glicose, também chamada de solução polarizante, pode ser preparada da seguinte forma: insulina regular 10 UI + 25 g de glicose (50 mL de glicose 50% ou 125 mL de glicose 20%). A administração deve ser realizada de forma intravenosa em bolus (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/36689973/,https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf, https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26477412/, https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/2266671/). 

O início de ação é rápido, com queda detectável do potássio sérico em cerca de 15 minutos após a infusão. O efeito máximo costuma ocorrer entre 30 e 60 minutos, com duração média de até 2 horas, quando pode ocorrer aumento da concentração sérica de potássio (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). A administração de 10 UI de insulina regular e glicose promove uma redução média do potássio em torno de 0,65 a 1,0 mEq/L (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/2266671/, https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf).

O principal efeito adverso da terapia com insulina e glicose é a hipoglicemia iatrogênica (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32979855/, https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/34625340/). Até 20% dos pacientes podem apresentar glicemia < 72 mg/dL em até 6 horas da terapia. Os principais fatores de risco para hipoglicemia são glicemia basal < 126 mg/dL, ausência de diabetes mellitus e repetição de doses de insulina no mesmo episódio de hipercalemia (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32979855/, https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/34625340/).  

Visando a diminuição do risco de hipoglicemia, uma metanálise de 2021 com 10 estudos retrospectivos encontrou que o uso de baixa dose de insulina (5 UI ou <10 UI) se associou a menor risco de hipoglicemia, mas sem diferença significativa na redução do potássio em comparação à dose padrão de 10 UI (diferença média −0,02 mEq/L). Estudos prospectivos são necessários para a confirmação destes achados (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33993515/). 

A administração de insulina e glicose pode ser dividida conforme a glicemia:

  • Glicemia < 126 mg/dL: insulina regular 10 UI + 25 g de glicose seguida da infusão de glicose 10% por 5 horas (50 mL/h, total 25 g) (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf).
  • Glicemia entre 126 e 249 mg/dL: insulina regular 10 UI + 25 g de glicose em 5 bolus.
  • Glicemia ≥ 250 mg/dL: insulina regular 10 UI sem glicose (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26880451/). 

A monitorização da glicemia deve, idealmente, ser feita a cada 30 minutos durante as duas primeiras horas após a infusão de insulina e, em seguida, a cada hora ao longo das primeiras seis horas (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf).

β2-agonistas

Os β2-agonistas, como o salbutamol, também agem por meio da ativação da Na⁺/K⁺-ATPase, facilitando a entrada de potássio para dentro da célula e diminuindo seu nível sérico (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf).

O salbutamol, principal β2-agonista usado no manejo da hipercalemia, pode ser administrado por nebulização em doses de 10 a 20 mg em 10 minutos (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26477412/). 
Apresenta início de ação em torno de 30 minutos após a administração (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). O pico de ação do salbutamol é dose dependente, ocorrendo em 120 minutos com 10 mg e em 90 minutos com 20 mg, com duração de pelo menos 2 horas de seu efeito (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35658162/,https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35658162/,https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). Na indisponibilidade de salbutamol na solução para nebulização, pode ser utilizado o salbutamol inalatório na dose de 1.200 mcg (12 jatos de 100 mcg) (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/10084465/).

Sua eficácia também varia com a dose administrada, com reduções médias de 0,53 a 0,88 mEq/L com a dose de 10 mg, e de 0,66 a 0,98 mEq/L com a dose de 20 mg (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). A terbutalina subcutânea não é recomendada como primeira linha, mas pode ser considerada em pacientes que não toleram a nebulização com salbutamol e a opção injetável esteja indisponível (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/15957133/). 

A associação de insulina e salbutamol possui efeito aditivo na redução do potássio, promovendo quedas médias de até 1,2–1,5 mEq/L após 60 minutos de seu uso. O salbutamol apresenta resposta variável e pode ser ineficaz em alguns grupos, como pacientes com doença renal crônica em estágios mais avançados ou em uso de beta-bloqueadores não-seletivos; motivo pelo qual não deve ser usado em monoterapia (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/2266671/, https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf).

Os principais efeitos adversos dos β2-agonistas são tremores, palpitações, taquicardia e cefaleia, o que pode limitar seu uso em alguns pacientes (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26477412/).

Medidas de remoção de potássio e ciclossilicato de zircônio (Lokelma ®)

As três opções disponíveis para remoção do potássio corporal são: diuréticos de alça, trocadores gastrointestinais e a diálise. As indicações de diálise na hipercalemia foram discutidas em outro tópico. Veja mais em "Urgências Dialíticas", no subtópico 'Hipercalemia refratária'.

Diuréticos de alça

Os diuréticos de alça, como a furosemida, promovem a remoção do potássio corporal através da excreção urinária deste cátion. Apesar desta ação, não há evidências que comprovem sua eficácia no contexto da hipercalemia aguda (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32852924/). Seu uso é recomendado principalmente na presença de hipervolemia, sempre como adjuvante às demais terapias, e não como monoterapia (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/38425037/). Não há uma dose definida de furosemida para o tratamento da hipercalemia. Recomenda-se 20 a 40 mg por via oral ou endovenosa, com possibilidade de repetição de uma a duas vezes ao dia.

Na ausência de hipervolemia, existe um benefício teórico do uso de diuréticos de alça em associação à infusão de solução salina isotônica. Até o momento, não há estudos que comprovem a eficácia desse mecanismo na hipercalemia aguda.

Trocadores de cátions gastrointestinais: ciclossilicato de zircônio sódico (Lokelma ®)

O ciclossilicato de zircônio sódico (CZS) é um trocador de cátions não absorvível que atua em todo o trato gastrointestinal, promovendo a troca seletiva de íons sódio e hidrogênio por potássio e amônio no lúmen intestinal. Essa ação favorece a excreção fecal do potássio e a redução da sua concentração sérica (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf, https://www.ema.europa.eu/en/medicines/human/EPAR/lokelma).

Em estudos randomizados o uso de ciclossilicato de zircônio baixou o potássio em média 0,7 a 1,1 mmol/L (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25415807/, https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/39112102/). Em pacientes com hipercalemia aguda, a dose sugerida na fase de correção é de 10 g por via oral, três vezes ao dia, por até 48 a 72 horas. O medicamento consiste em um pó, que deve ser diluído em água e ingerido por via oral. Sua administração no tratamento da hipercalemia aguda deve sempre ser adjuvante às terapias de shift e nunca em monoterapia (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32852924/, https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32149451/).

O início de ação ocorre em cerca de 1 hora (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25415807/, https://www.ema.europa.eu/en/medicines/human/EPAR/lokelma) com efeito máximo observado nas primeiras 24 a 48 horas (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25402495/, https://www.ema.europa.eu/en/medicines/human/EPAR/lokelma). Em um estudo retrospectivo envolvendo pacientes hospitalizados com hipercalemia assintomática, a administração de 10 g, 3x ao dia, do CSZ resultou em uma redução média de 0,78 mEq/L do potássio sérico no intervalo de 12 a 30 horas após a última dose (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37475499/). 

O uso de dose de manutenção pode ser considerado em pacientes com risco de recorrência de hipercalemia, como pacientes com doença renal crônica ou em uso de medicamentos que elevam a concentração sérica de potássio, como os inibidores do sistema renina angiotensina aldosterona ou antagonistas de mineralocorticóides. Nestes casos, a dose sugerida é de 5 a 10 g/dia (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26477412/, https://www.ema.europa.eu/en/medicines/human/EPAR/lokelma). 

Os principais efeitos adversos associados ao uso do CSZ são hipocalemia, constipação e edema periférico (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25402495/). 

Em maio de 2025, o CSZ foi incorporado ao SUS para o tratamento da hiperpotassemia em pacientes com doença renal crônica estágios 4 e 5, mas sua distribuição continua em processo de implantação (https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/relatorios/2025/sociedade/20250523_ReSoc_522_Ciclossilicato_Hiperpotassemia.pdf).

Outros trocadores de cátions

Apesar de ser usado por mais de 60 anos, o uso rotineiro de sulfato de poliestireno sódico (SPS, Sorcal®) na hipercalemia aguda é contraindicado. Além de apresentar lento início de ação (> 4 horas) e efeito imprevisível na redução do potássio sérico, há risco de eventos adversos gastrointestinais graves, como necrose intestinal (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31180477/, https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). O uso do SPS deve ser restrito apenas às situações em que há hipercalemia potencialmente grave e a diálise e outros trocadores de cátions não estiverem disponíveis (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31180445/). 

O patiromer, apesar de aprovado em alguns países, não está disponível no Brasil.

Reavaliação

Após instituído o tratamento inicial, a dosagem sérica de potássio deve ser repetida em 1 a 2 horas, já que as principais terapias de shift intracelular atingem seu efeito máximo entre 30 e 90 minutos. Após normalização, novo potássio deve ser coletado em 4 a 6 horas devido ao risco de aumento sérico rebote (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32852924/, https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35658162/, https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/2266671/). Adicionalmente, a United Kingdom Kidney Association (UKKA), recomenda uma última dosagem após 24h do tratamento para garantir que os valores de potássio foram controlados. 

Recomenda-se ainda repetir o ECG nos pacientes com alterações iniciais ou sempre que houver recorrência da hipercalemia, pois arritmias graves podem surgir mesmo sem mudanças progressivas no traçado (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf).

O tempo de internação depende da gravidade inicial, do risco de rebote e da presença de doença renal ou outras condições precipitantes. Pacientes graves devem permanecer sob monitorização cardíaca contínua, enquanto casos moderados podem ser acompanhados em enfermaria desde que haja possibilidade de reavaliações seriadas (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf).

Para reduzir a chance de recorrência, é essencial investigar e corrigir fatores precipitantes, como constipação, acidose, hiperglicemia, rabdomiólise ou uso de drogas que aumentam o potássio, além de instituir medidas de prevenção secundária, como ajuste dietético e revisão da prescrição de medicamentos associados à hipercalemia (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). 

A alta hospitalar deve ser considerada com a redução da hipercalemia para valores seguros (< 6 mEq/L), de forma estável, com ECG normalizado, e plano de cuidado definido com monitorização laboratorial ambulatorial precoce (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf). Pacientes com hipercalemia grave, refratária ou de causa não resolvida devem ser encaminhados para acompanhamento especializado com equipe de nefrologia (https://www.ukkidney.org/sites/default/files/FINAL%20VERSION%20-%20UKKA%20CLINICAL%20PRACTICE%20GUIDELINE%20-%20MANAGEMENT%20OF%20HYPERKALAEMIA%20IN%20ADULTS%20-%20191223_0.pdf).

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